RETRATOS DO DULCISMO/ Edna Silva Lima Uchôa “Dulcismo é acolhimento”
Há pouco mais de um ano, a manicure Roquelina dos Santos Conceição fraturou o quadril e viu sua vida mudar drasticamente. Paciente das Obras Sociais Irmã Dulce (OSID) e moradora do município de Sapeaçu, no Recôncavo baiano, ela foi submetida a uma cirurgia e passou a fazer sessões semanais de fisioterapia na capital. A rotina puxada – sobretudo para quem convive com a dor – exige que todas as sextas-feiras Roquelina embarque às 4h na van da prefeitura com destino a Salvador, e inclui uma jornada solitária e extenuante com pausa só no fim do dia, na viagem de volta para casa.
Mas essa agenda ficou um tanto mais leve desde que a moça passou a frequentar o Abraço Acolhedor, projeto da OSID que acolhe pacientes em atendimento na instituição para oferecer-lhes uma recepção cheia de calor humano. Foi assim que no último dia 16 de agosto, seu 35º aniversário tinha tudo para passar em branco, mas se transformou num “sextou” inesquecível. A turma do Abraço a surpreendeu com bolo, balões e um sonoro “parabéns a você”, uma surpresa que deixou a paciente “muito feliz e emocionada”, como declarou. Para além das cenas registradas em imagens que ela vai guardar de lembrança, não há como esquecer do carinho, pois ficaram gravadas em seu coração todas as demonstrações de empatia e amor ao próximo, valores que estão no DNA do Dulcismo – o jeito Dulce de pensar, ser e agir.
Além de Roquelina, mais de oito mil pacientes e acompanhantes receberam esse abraço de pura solidariedade desde março de 2023, quando o projeto passou a funcionar oficialmente. Na estrutura simples e acolhedora instalada no prédio histórico do antigo Abrigo D. Pedro II – que teve seu uso concedido para a gestão da OSID em 2019 –, os pacientes e seus acompanhantes podem descansar da viagem; tomar um banho e um café reforçado para enfrentar com mais energia um dia inteiro de procedimentos médicos. E sabendo que em meio a tudo isso alguns ainda têm que lidar com diagnósticos dramáticos, no Abraço a compreensão de “acolhimento” inclui a boa conversa e uma palavra amiga num dia difícil. Esta é a proposta deste projeto que tanto reflete o “Amar e Servir”, propósito maior das Obras Sociais Irmã Dulce. Na coordenação do Abraço Acolhedor está a assistente social Edna Silva Lima Uchôa, uma colaboradora da OSID envolvida nesse projeto em todas as suas fases. Além da franca vocação social, ela tem uma forte conexão com a espiritualidade e o Dulcismo.
Essa é uma história bonita e permeada de sincronicidades, que começa muito antes de Edna concluir sua formação em Serviço Social (2015). O olhar compassivo, ela traz da juventude, antes até do tempo em que foi religiosa da Comunidade Bernadete, nos Alagados. Dessa época de missionária, lembra com especial afeto do encontro com Dona Dulcinha – irmã de Santa Dulce dos Pobres e mãe de Maria Rita Pontes, superintendente da OSID –, numa visita às Obras: “Ela deu uma camisa com a estampa de Irmã Dulce para cada pessoa da comunidade e eu vesti essa camisa como ouro, pois já era devota do Anjo Bom e sempre me identifiquei com esse trabalho com os pobres. Eu sempre quis fazer algo assim”.
Nos bancos da igreja – Edna não seguiu a vocação para ser freira, mas a fé a compaixão já tinham feito morada em seu coração. Assim, anos mais tarde seus laços espirituais com a caridade acabaram buscando outras formas de expressão. Certo dia, quando estava na Igreja da Imaculada Conceição da Mãe de Deus (futuro Santuário Santa Dulce dos Pobres), em oração compartilhou com o Anjo Bom um desejo sincero: “Irmã Dulce, eu quero muito trabalhar num lugar que seja católico, onde eu possa viver a minha fé”. Isso foi no final de 2011. Meses depois, Edna recebeu uma ligação de Irmã Adriana, do Instituto Filhas de Maria, fundado por Santa Dulce, convidando-a a assumir o seu lugar como assistente administrativa na secretaria do futuro Santuário.
Foi nessa época que a nova assistente passou a compartilhar da mesma angústia dos religiosos que ali atuavam, pois observavam que pacientes das Obras vindos do interior do estado encontravam na igreja – que é um lugar de oração – um espaço improvisado para descansarem e se alimentarem até a hora de sua viagem de volta. “Víamos que aquilo não era digno, mas não havia um local para acolher aquelas pessoas”. As cenas de uma jovem mãe debruçada sobre sua bebê, ambas dormindo no banco da igreja, e de um senhor se alimentando por sonda na área externa, foram algumas das situações que impulsionaram a implantação do projeto Abraço Acolhedor.
Construção coletiva – A ideia de criar um espaço para acolher o próximo estava profundamente ancorada nos valores do Dulcismo e isso era forte o bastante para buscar materialidade para o projeto. Em 2018, após ser transferida para o núcleo de Turismo Religioso, no Complexo Santuário Santa Dulce dos Pobres, já como orientadora social, Edna participou de novas articulações. Até que em 13 de março de 2023, com o apoio da Gestão Operacional, do Complexo Santuário e do setor de Recursos Humanos, o Abraço Acolhedor foi implantado oficialmente. O espaço “é fruto de uma construção”, como ela mesma diz, que envolveu um esforço coletivo voltado ao bem comum. Paciência, perseverança e amor são os principais valores envolvidos nessa jornada, que ao longo dos anos vem superando muitos desafios “e que tem outros pela frente”, como reconhece a coordenadora do projeto: “Ainda queremos reativar experiências positivas que já tivemos, como a brinquedoteca, por exemplo”.
Gerido e mantido pelas Obras, o Abraço Acolhedor é um projeto com o compromisso de cuidar do outro. E isso vai iluminando cada dia. É assim que, espontaneamente, chegam voluntários para ajudar no trabalho, novos apoios e parcerias e até as delícias para serem servidas nos cafés àqueles que por ali vão passar. Num espaço criado com a missão de acolher, o Dulcismo está em toda parte. Esta é a leitura de Edna: “Para mim, Dulcismo é acolhimento. Porque, ao acolher, você dá paz. Quando você acolhe, manifesta empatia. Então, é no nosso dia a dia que a gente mostra os valores de Santa Dulce dos Pobres, mesmo num pequeno gesto. É tão simples fazer o bem...”.
Assim faz a alma, quando alinhada com a espiritualidade: sai pelo mundo criando beleza. A inspiração desse trabalho é sutil; permeia o sonho, antes mesmo de se tornar realidade, e está viva numa lembrança de infância que Edna Uchôa guarda no coração: “Durante uma caminhada penitencial, no início dos anos 1990, passando na frente do Convento Santo Antônio, vi Irmã Dulce na janela, acenando para as pessoas que passavam. Então, essa memória ficou e reacendeu em mim”. E seguirá reacendendo. Através do Dulcismo, Santa Dulce dos Pobres continua acenando, tocando corações e inspirando amor.
Assista ao vídeo da série no canal YouTube da OSID: https://youtu.be/7JAtMFaiLLs