Reconstituição lábio-palatal devolve auto-estima a pacientes
25 de July de 2005
Conhecer o Centrinho das Obras Sociais Irmã Dulce mudou a vida de Crispina Costa, 28 anos, moradora da cidade de Pojuca, no interior da Bahia. “O melhor resultado da cirurgia foi o jeito de as pessoas falarem comigo e de olharem para mim também. Parecia que era contagioso o que eu tinha. Melhorou muito”, conta Crispina. Portadora de fissuras no lábio e no palato, ela sentia na pele a discriminação, mesmo velada. Há dez anos ela fez a cirurgia, após acompanhamento multidisciplinar no Centrinho.
Inaugurado em 1998, o Centro de Reabilitação de Anomalias Crânio Faciais – Centrinho da OSID, é a segunda maior unidade do país na recuperação de fissurados e é referência para o Ministério da Saúde no atendimento a pacientes do Norte e Nordeste. O atendimento multidisciplinar investe na recuperação integral e possibilitou a realização de 82.286 procedimentos em 2004 (quase quatro vezes mais que em 2003), o registro de 248 casos novos, além da realização de 287 cirurgias – desde 1998, já foram 1538 procedimentos cirúrgicos realizados.
A desinformação ainda é um dos grandes obstáculos para que portadores de anomalias no lábio e no palato sejam encaminhados, logo após o nascimento, aos cuidados de especialistas. No caso de Crispina, foram 18 anos de espera por cirurgias que podem ser realizadas no primeiro ano de vida – a cirurgia de lábio, queiloplastia, pode ser feita a partir do terceiro mês de vida; a palatoplastia, quando se completa um ano. “Eu não sabia que existia esse tipo de tratamento aqui em Salvador”, contou Crispina. O tratamento e a informação de Crispina sobre a anomalia fez com que sua filha, Jéssica, de três meses, também portadora de fissuras, fosse acompanhada já no primeiro mês após o nascimento.
No Centrinho, as más formações congênitas do lábio e do palato não são vistas apenas como patologia médico-odontológica, mas como um problema também sócio-emocional. O acompanhamento não termina quando o paciente é submetido aos procedimentos cirúrgicos que amenizam os danos das fissuras. O processo de reabilitação é um trabalho continuado de médicos, dentistas, psicólogos, assistentes socais e fonoaudiólogos e outros especialistas que vêem na reinserção plena de cada paciente ao convívio social o propósito final de suas ações.
Causas - Há evidência de que fatores genéticos e ambientais participem na patogenia dessas anomalias. Eles podem atuar só ou conjugados. Tudo leva a crer que, quando somados, a predisposição genética e os fatores ambientais aumentam sua incidência. O uso de drogas ou medicamentos, deficiência de vitaminas ou ácido fólico, idade avançada dos pais no período de concepção e processos infecciosos durante a gestação podem contribuir para a anomalia congênita. Processos psíquicos e sócio-econômicos também são apontados pelos especialistas como uma das causas para o surgimento das fissuras.
No Brasil, as más formações congênitas do lábio e do palato encontram-se entre o terceiro e quarto defeitos mais freqüentes, com proporção de um fissurado para cada 650 nascimentos. Estima-se que existam hoje 180 mil fissurados no país. Além dos fatores ambientais, a etnia do paciente também modifica as probabilidades de desenvolvimento das anomalias lábio-palatais. É observada maior incidência na raça amarela do que na raça negra. Nos orientais é cerca de 1/469, nos negros é de 1/1300 e, nos indivíduos de cor branca, é de 1/750.
Quanto à hereditariedade, registra-se que um terço dos casos estão relacionadas a manifestações anteriores nos descendentes. Pessoas normais têm 1% de chance de terem filhos fissurados; pais normais de filho fissurado, 4,5%; e pais fissurados de filhos fissurados apresentam probabilidade maior, 15%. Dados do Centrinho da OSID apontam também que 5% dos casos são resultantes de mutações genéticas.
As anomalias crânio-faciais provocam danos físicos que se refletem no sistema respiratório, auditivo, digestivo, dentição e na articulação da fala, além de um forte impacto psicológico trazido pelo preconceito. Esse quadro se agrava quando as anomalias não são tratadas no primeiro ano de vida do paciente – problema que ocorre mais comumente nas camadas carentes da população. Dos casos ocorridos no Centrinho da OSID, 94,69% ocorrem entre indivíduos de baixa renda, sendo que 66,48% foram classificados como muito pobres. Destes, 67,13% vêm do interior da Bahia e 37,38% têm entre zero e cinco anos. A maioria dos casos (69,2%) é de pacientes que têm entre zero e 20 anos.